Escrito por Mhércio Monteiro
Advogado / Especialista em Gestão Pública.
Colunista do Blog Agravo
Desde o final da década de 80, Ilhéus vem sendo vítima (e ao mesmo tempo responsável) por uma política administrativa absolutamente equivocada, superficial e principalmente omissa. Sucessivos prefeitos aceitaram pacificamente o papel de meros “chefes de departamento pessoal”, limitando-se a relacionar o “sucesso” de sua gestão ao pagamento pontual do funcionalismo público municipal.
A sociedade ilheense, por características próprias, acordou tardiamente para a real capacidade do poder da política promover a transformação social de que tanto necessita a cidade. Na eterna esperança do retorno da lavoura cacaueira, ilhéus se fechou para o desenvolvimento de outras áreas, enquanto outras cidades da Bahia curvaram-se a realidade mais precocemente, a exemplo de Vitória da Conquista pós ciclo do Café, dentre outras.
O retrato atual, demonstra a inexistência de uma só obra significativa realizada em Ilhéus nos últimos 20 anos que tenha como autor e executor exclusivo o Município de Ilhéus. Naturalmente não me refiro, propositalmente, a obra oriundas de convênios com outros entes, essas são poucas, mas existem. Ao meu ver, a crise fiscal do município ilheense é mais grave de sua história, e o horizonte é um convite a ação.
A deficiência de governança vem abraçada com o total improviso no planejamento urbano. Há alguns anos atrás, um ex-prefeito permitiu (por ação ou omissão) a invasão a um manguezal na entrada da cidade, e, com influência familiar, “posteou” o local e levou energia elétrica para invasores de uma área de preservação ambiental.
Anos depois, o mesmo aconteceu no leito rio Almada, no bairro da Barra. Alí também surgiu uma nova favela com a solene omissão dos prefeitos que se sucederam. Faltou coragem de desgastar-se com uma parcela da sociedade, em defesa do futuro da cidade.
O desafio do próximo prefeito de ilhéus, seja ele qual for, será desafio de vida, de mudança de paradigma, ignorando o feijão com arroz, e cuidando de dar um choque de ordem na cidade, sem seu sentido mais amplo.
O novo administrador tem o dever de rever completamente o caminhar de Ilhéus e evitar o pior. É necessário coragem para quebrar o padrão hoje existente, de compadrio, de omissão, de ausência de protagonismo local e regional. O município de Ilhéus tem que exercer sua liderança histórica, para ser respeitado, para pleitear junto às esferas estadual e federal, aquilo que lhe é de direito.
É necessário alguém com coragem suficiente para re-construir parâmetros mínimos de decência, responsabilidade fiscal e inovação, abandonados ao longo dos últimos 20 anos, em nome da clássica demagogia do voto em troca de terreno, ainda que seja num manguezal protegido por Lei Federal.
O primeiro desafio me parece elementar: tornar a prefeitura municipal na indutora do crescimento econômico da cidade, a luz de um planejamento estratégico, com uma cultura de atração de investimentos privados de alto valor agregado.
Não entendo até hoje por que Ilhéus não possui nenhuma indústria de chocolate. Quem conhece a fábrica dos “Chocolates Garoto” em Vila Velha, no Espírito Santo, sabe do que estou me referindo.
Não entendo por que o filho mais ilustre, Jorge Amado, não possui uma praça a altura de sua obra e importância mundial. Apenas para registro, em Paris, quase a totalidade dos pontos turísticos foram criados pela interferência direta do homem, quase sempre em homenagens a personagens, datas, ou eventos. Aqui, sequer exaltamos a beleza natural dada por Deus, muito menos existe alguma intervenção humana reverenciada adequadamente.
A perspectiva de construção da Ferrovia Oeste Leste e de um novo Porto para o município só farão algum sentido se ilhéus for capaz de atrair investimentos perenes, não somente que sustente a lógica da exportação, mas, que seja capaz de sobreviver as alternâncias do comércio internacional.
Na eminência de se construir a ferrovia, é imperioso pensar agora o que desejamos dela. Seria importantíssimo que Ilhéus lutasse para ter uma siderúrgica, como beneficiamento do minério de ferro produzido pela região de Caetité. Nesse ponto de partida seria natural a vinda de outras indústrias satélites, dependentes da primeira, como por exemplo, a metalurgia.
Fala-se também na construção de um novo aeroporto, alguém já discutiu o que será feito com a área do antigo sítio aeroportuário? Esse imóvel será devolvido ao município ou ao Estado? Ilhéus precisa antecipar debates e visualizar soluções antes que os problemas surjam.
Penso que a hipótese mais razoável é a da devolução/doação da área para o município (mediante ajuste com a União), entendo que seria possível a obtenção de novas receitas com a nova perspectiva, na medida em que, em sendo elevado o gabarito dos imóveis da região do pontal, haveria uma grande procura pelo imóbiliária.
Aliás, fato parecido vem acontecendo em Salvador, na região da avenida paralela. A possibilidade hipotética que me agrada seria a da elevação do gabarito exclusivamente para a área do antigo aeroporto e a alienação dela, pelo município para parceiros privados, com significativos ganhos de receita, cumulados paralelamente a ganhos sociais, como a melhoria das redes pluviais e de saneamento, compatíveis a nova realidade demográfica daquela região, inclusive com novas avenidas e praças.
Há outros debates a ser fazer, como se nota, existem discussões profundas sobre o futuro de Ilhéus. Seja qual for o novo gestor, o desafio é planejar ilhéus para os nossos netos passa pela atuação de hoje. O Censo 2010 sinaliza que algo necessita ser feito, o primeiro passo é pensar.